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Porque a Privatização da Eletrobrás Seria Inconstitucional

    Dercio Garcia Munhoz, Economista

O governo encaminha a privatização da Eletrobrás segundo as regras da Lei 4182/2021, Art 1o, Pár. 1o, que estabelece: “A desestatização da Eletrobrás será executada na modalidade de aumento do capital social, por meio da subscrição pública de ações ordinárias com renúncia do direito de subscrição da União, e será realizada mediante a outorga de novas concessões de…”.

– Ora, a modalidade estabelecida na lei altera a participação dos acionistas na propriedade da empresa, aumentando o valor do patrimônio daqueles que subscrevem as novas ações, e reduzindo para os que não fizerem a subscrição, como seria o caso da União. Então, de fato, com o Governo não subscrevendo ações novas, o que ocorreria seria uma transferência de parte do patrimônio público para terceiros – indiscutivelmente uma doação de bens públicos.

O que não está previsto na Lei 14182/2021, nem na Lei 9491/1997.

– A doação de bens públicos é disciplinada pela Lei 8666/1993, que abrange, dentre outros, empresas públicas e sociedades de economia mista, requer avaliação prévia, e é “…permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública …” (Art. 17, I-B)

– No caso da Eletrobrás, com o lançamento de novas ações – aproximadamente 200,0 milhões – a União estaria reduzindo sua participação da Eletrobrás de 42,5% para 37,8% sobre o global das ações, perdendo um naco próximo de 5,0% da propriedade da empresa. Pelo valor patrimonial da ação, a doação seria perto de R$5,0 bilhões; se levado em conta o valor estimado do patrimônio da Eletrobrás e dezenas de suas subsidiárias, de no mínimo, R$500,0 bilhões, a ser avaliado conforme estabelece a lei, a doação camuflada, engatilhada intramuros, seria de no mínimo de R$25,0 bilhões.

– É, fundamental não desprezar o fato de que a Eletrobrás responde por mais de 40,0% da energia gerada no país, e tem responsabilidade por mais de 70,0 mil km. de linhas de transmissão, e papel fundamental para a economia, para a população em geral, e para o futuro do país. Não cabe espaço, portanto, para que o encaminhamento da questão se veja envolvido, por ação ou omissão, em um nível tão grave de irresponsabilidade dos diferentes poderes da República.

-dgm./11-05-2022

Preços dos Combustíveis (II):  CPMF Mortal ou Mera Pedalada Fiscal ?

                                                                       Dercio Garcia Munhoz, Economista

       Enquanto o país sofre as conseqüências de uma nefasta política de preços de combustíveis, que agrava a crise de uma economia que, sem rumos, mal navega, já para a Petrobrás e seus dirigentes, seus acionistas, incluso o Governo, e circundantes, tudo significa tal qual um maravilhoso toque de Midas que transforma o petróleo em ouro.  O histórico é simples: com um custo no Pre-sal inferior a cinco dólares/barril, considerou a Petrobrás nas planilhas de custos, valores em torno de US$ 40,0/barril em 2020, US$ 70,0/barril em 2021, e agora, em 2022, a base supera a US$ 100,0/barril.  O que tem feito da Petrobrás, na seara dos ganhos especulativos, na melhor entre as melhores – ou the best of the best, como diriam os ingleses.

02 – Foi assim que a empresa conseguiu gerar, no ultimo ano, um lucro superior a cem bilhões de reais. O que transformou uma eficiente petroleira numa fábrica de royalties e dividendos, e ganhos outros, que distribui fartamente.  Inconcebível, quando se espera de uma estatal, pela própria razão de ser, uma contribuição efetiva para a economia, para o país, visando a  redução dos custos de produção, transporte e comercialização de bens e serviços.

03 – Mas o absurdo corrói por dentro a Petrobrás. Pois é inaceitável que uma empresa com divida superior R$ 260,0 bilhões tenha decidido distribuir aos acionistas praticamente a totalidade dos lucros do ano.  Mais do dobro do valor investido. O que evidencia que faz falta, na área federal, um órgão colegiado voltado à normatização da  gestão das estatais, já que dirigentes indicados pelo sócio majoritário – assim como Ministros e membros de agências reguladoras – são meros prepostos do Estado, e não proprietários das empresas.  Cabendo acrescentar que o caótico quadro atual envolve outras estatais, também sob intensa cobiça das aves de rapina, dentro e fora do Governo.

04 – É vital assinalar, por outro lado, que não se trata de questão que possa ser desprezada, tida como simples controvérsia, e assim deixada às calendas gregas. Já que a política de preços de terra arrasada, vangloriada por muitos, vem tendo conseqüências de extrema gravidade. Afinal, se a jogada dos preços dos combustíveis deu agora à Petrobrás um ganho extra, espúrio, estimado em R$ 110,0 bilhões, no fim da linha, ao incluir gastos com impostos, transporte e distribuição, o aumento da conta jogada sobre os consumidores chegou a R$ 250,0 bilhões em 2021.  E agora ainda mais.

05 – Mas os fatos são ainda mais graves. Já que, pelos mecanismos de transmissão de custos na economia, todo o peso cai, através da inflação, integralmente nos ombros de apenas parte dos consumidores; daqueles que, frágeis na luta pela existência, não conseguem transferir, desde logo, os aumentos de custos para terceiros: são os núcleos de trabalhadores formais e informais, e dos aposentados, e a maioria dos autônomos e dos pequenos comerciantes e industriais.

06 – Resta enfatizar que o tamanho da sobrecarga ligada aos preços dos combustíveis, de 2021, é inegavelmente brutal, equivalendo a se dobrar o imposto de renda retido na fonte em 2021 (que foi de R$ 247,8 bilhões); ou então igual a um aumento de 20,0% em todos os tributos existentes na área federal.  O que tem ares de uma mortal CPMF, travestida de uma magistral e aparentemente inofensiva pedalada fiscal. 

 

-dgm./29-04-2022

Petrobrás (I) – Preços e Lucros na Penumbra

Dercio Garcia Munhoz, Economista

O Brasil, no grupo dos 15 maiores produtores mundiais de petróleo, do qual faz parte, figura dentre aqueles com menores custos de produção – US$ 4,60/barril no Pré-sal (nivelando-se à Arábia Saudita, Emirados Árabes e Estados Unidos), e R$ 6,60/barril na média nacional. Mas paradoxalmente é onde se pratica, no nucleo, os mais elevados preços para o consumidor; no caso da gasolina tem o 12º. maior preço, dentre os 15; maior inclusive que nos Estados Unidos, e superados (novembro 2021) apenas na China, Canadá e Noruega. Os preços, no Brasil, são tão absurdos que equivalem a mais que o dobro daqueles pagos internamente em sete dos 15 maiores produtores mundiais de petróleo.

02 – O diferencial dos preços não se explica pelos impostos (que, como outros custos ex-refinarias são ad-valorem, refletindo o valor-base praticados pela petroleira). Mas sim porque a Petrobrás, distanciando-se da premissa que uma estatal estratégica deveria observar (custos + remuneração do capital que permita reinvestimentos), fixa os preços internos com base nos preços internacionais do petróleo – que agregam. dentre outros itens, fretes marítimos e rodoviários, despesas portuárias e seguros. Prática abusiva que os números revelam distante da orientação dos governos na grande maioria dos demais produtores top.

03 – Aqui o governo acolhe e acoberta uma decisão esdrúxula, de órgãos da administração e dirigentes da empresa fora do mundo real, fundada em inconcebível ficção, considerando como se as refinarias locais estivessem recebendo o petróleo não dos excepcionalmente produtivos poços das Bacias de Campos, Santos ou alhures, próximas, mas sim do distante Oriente Médio, da Rússia, do Golfo do México ou dos desertos do Texas. Gerando, com a falseta, lucros inconcebíveis, dividendos inimagináveis, ganhos fantásticos para os Governos federal, estaduais e alguns municípios. E, the last and most important, efeitos devastadores para o país.

-dgm./16.04.2022

A Privatização da Eletrobrás: Tem Gato na Tuba (I)

A Privatização da Eletrobrás: Tem Gato na Tuba ( I )

A IPO (oferta de ações) seria apenas uma cortina de fumaça Para Passar a Boiada?

Dercio Garcia Munhoz. Economista Emérito pelo Corecon-DF. Foi Professor Titular de Economia da
UNB. Ex-Presidente do Conselho Federal de Economia e do Conselho Nacional da Previdência Social.

O Ministério da Economia alegava tirar dos ricos para dar aos pobres quando iniciou o desmonte do INSS urbano, no final de 2019, anunciando então, sem pudor, “economizar” R$ 3,4 trilhões. E, de fato, as novas aposentadorias e pensões dos “ricaços” do INSS foram reduzidas. Sucesso do ardil para inserir a previdência brasileira no modelo Pinochet. E o Congresso, indiferente, passou recibo no engodo, sem pestanejar.

A mesma astucia agora, com a Eletrobrás. Transferindo o controle da empresa para abnegados empresários, o Ministro anuncia arrecadar R$ 100,0 bilhões, e que os ganhos vão para os pobres. O Congresso vai engolir mais essa ? De resto uma grossa fantasia, pois, ainda que a proposta tivesse cunho de seriedade – ausente em praticamente todo o conteúdo dito reformista – não parece exeqüível.

A dúvida atroz é quanto aos verdadeiros objetivos do Ministério da Economia, diante dos zigue-zagues em relação à Eletrobrás nos anos recentes. Falar em uma venda maciça de ações da empresa, é um sonho ou uma farsa. Já que nenhuma das maiores IPO da década passada, no Brasil, ultrapassou R$ 11,5 bilhões. Assim, sô o anuncio de uma IPO de mais de R$ 40,0 bilhões e perto de 1,0 bilhão de ações novas – que seria o caso da Eletrobrás para ficar menos distante dos falados cem bilhões — balançaria a Bolsa, dadas as incontornáveis implicações.

Na hipótese da venda de apenas 350 mil ações – mantendo o Governo Central 45,0% da empresa – pouco sobraria para o Tesouro, pois parte dos R$ 16,0 bilhões arrecadados seria de ações detidas pelo BNDES, destinando-se o restante a subsidiar por uns tempos os preços da energia, Como antes anunciado pelo Governo, diante do propósito de aumentar as tarifas da Eletrobrás privatizada.

Há, portanto, algo de muito estranho nisso tudo. Afinal, e a história dos R$ 100,0 bilhões? Inevitável admitir que ai tem gato na tuba. Como dizia a conhecida marchinha carnavalesca do final dos anos 40, de Braguinha e Alberto Ribeiro.

-dgm./12.07.2021

I – ECONOMIA Á DERIVA: ELETROBRÁS. Pauta da Assembléia convocada para 29.07: “Alterar os jornais em que … realiza suas publicações legais”.

–  Porque a Eletrobrás, na Assembléia convocada para 29.07, vai “alterar os jornais em que … realiza suas publicações legais”?  Ou seja, porque os acionistas vão decidir pela troca de jornais ?

–  Muito estranho.  Será que a empresa está sendo obrigada, pelo Governo, a simplesmente punir alguns jornais pouco dóceis ? O projeto seria, então,  cooptar outros veículos da imprensa, ampliando o plantel de “chapas brancas” ?  Estaria o Governo mandando uma mensagem não cifrada, a toda a mídia, advertindo que agora o jogo é pesado ?

– A essas indagações se soma a hipótese, não menos provável, de que, regado por recursos oficiais, o Governo estaria ampliando o núcleo de veículos da mídia sob sua dependência financeira, reforçando a rede de divulgação de Fake News para assim criar um clima de pressão para a privatização da Eletrobrás. Tornando factível a meta de rifar a empresa por valor igual ao seu Lucro em 2019, o equivalelente ao que o Governo gasta com juros em apenas em 15 dias !

– Se esta for a provável estratégia, logo estarão se  mobilizando  não só grandes conglomerados  e empresas ligadas ao mercado financeiro, mas também milhares de ricos sindicatos patronais, perfilando-se através de paginas inteiras de jornais com mensagens moduladas para apoio ao assalto ao patrimônio publico –  as tão ansiosamente pregadas privatizações.

– Os indícios são claros no sentido de que o Governo pretende, em ações criadas e gerenciadas pelos núcleos de especialistas em marketing digital montados em áreas estratégicas, lançar uma nuvem de Fake News.  Repetindo, no assalto à Eletrobrás, o sucesso alcançado na reforma da previdência, quando, através de engodos, que vitimaram inclusive os congressistas, se avançou na meta de destruição do superavitário INSS urbano; na direção do espoliativo modelo Pinochet, o sonhado presente de Natal ansiosamente aguardado pelo mercado financeiro.

– Incrível a audácia, ou a fraqueza, dos dirigentes da Eletrobrás. Com a palavra a Câmara e o Senado, a Procuradoria, o Tribunal de Contas e o Supremo. Afinal, a algum desses poderes cabe decifrar o enigma da troca de jornais e suas implicações.

– Mas a questão da venda de uma empresa estratégica, altamente rentável, em momento de grave crise sanitária, econômico/financeira e social não é um episodio isolado.  Pois a esse intuito macabro o Governo pretende associar outras ações, como a proposta ensaiada de criar um fundo previdenciário para trabalhadores informais; avançando no projeto de destruir a previdência publica urbana, alvejada pelos torpedos de Fake News disparados na reforma na direção do INSS.  Enquanto paralelamente procura avançar para a liquidação dos Correios, a serem entregues a grandes multinacionais da área, que atuam no Brasil.  Pouco importando  se com isso serão depenadas no essencial milhares de pequenas cidades brasileiras. 

– Solução: liquidemos com os Correios. A população, nos seus núcleos mais sofridos, que se vire, passando a resolver seus problemas em municípios visinhos. Afinal qual o problema em percorrer  dez, vinte, cinquenta ou cem quilômetros para postar ou receber encomendas, fazer depósitos, saques, ou receber aposentadorias ou auxílios governamentais em longínquos guichês de  bancos ou  correspondentes bancários ?

– Afinal, porque a população mais humilde não aprendeu até agora como sobreviver num mundo onde as decisões são fruto da “sabedoria” de um núcleo elitizado de dirigentes, na maioria egressos das maiores universidades publicas, e que por longo tempo o Governo amamentou  em bolsas no exterior.  Mas, se perceberam a realidade que os cerca. . . que comam brioches, como sugeria Maria Antonieta aos seus súditos, nos estertores do reinado de Luiz XVI, na França do final do Século 18.

– Acordem senhores Congressistas. Acordem sindicatos e associações profissionais.  Inconcebível a liquidação de sistemas superavitários como a Previdência Publica Urbana, a venda na bacia das almas de empresas do mais alto caráter estratégico, e altamente lucrativas, como a Eletrobrás.  Não se podendo admitir que os tempos atuais venham a ser recordados, no futuro, como mera repetição do que ocorreu no ocaso da União Soviética, quando os abutres avançaram famintos sobre patrimônios da nação, apropiando-se das grandes empresas estatais.

-dgm./27.07.2020

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