ELETROBRÁS – Falso o Anúncio de Privatização Consumada
Dércio Garcia Munhoz
Os jornais noticiaram com alarde, no ultimo dia 15: “Eletrobrás – Governo oficializa a Privatização”. Em seguida se informa que o tradicional toque de campainha, na Bolsa, na terça-feira (14/6), oficializou a privatização da Eletrobrás.
Informação verdadeira ? Não. Grave equivoco, menos provável. Ou, mais realista, mera encenação. No episódio Governo e Bolsa teriam se unido para atropelar um processo já pleno de suspeição, simulando que navegavam tranquilamente numa de suas etapas.
O fato é que não se consumou a privatização da Eletrobrás na festiva solenidade, a despeito do mix de campainha e discursos. Pois ainda que a burlesca aventura não seja logo abortada pela CVM, como se impõe, o processo ainda vai depender de providências outras.
Tudo indica que o grupo envolvido na encenação – Bolsa de Valores, Ministros, ANELL, BNDES, etc., etc. – se articulou para consumar o assalto ao patrimônio público. Uma tentativa de ganhar no grito, nos moldes de uma operação a desoras.
Diferentemente do que pretendiam os gestores da artimanha, a tentativa de tratorar a platéia foi inútil. Pois o Art. 1º. da Lei 14.182, abjeta tanto pela forma como pelo conteúdo, estabelece que qualquer avanço para definir a pretendida doação ilegal, depende de outros passos:
“A desestatização da Companhia … Eletrobrás ocorrerá nos termos da Lei 9.491 … e do $ 1º. deste artigo e está condicionada à outorga de novas concessões de geração de energia para os Contratos de Concessão no. 007/2004 …. e no. 004/2004 …..”
As outorgas prévias são, por ora, projetos. O que leva a supor que a manobra, divulgando um falso c´est fini, visaria demover as resistências ao que já é conhecido como ”o golpe da Eletrobrás”. Mas falharam todos, e certamente por excessiva presunção.
Dúvidas não subsistem quanto à ilegalidade dos atos da Bolsa. Diante do que seriam nulas todas as operações relacionadas a ações novas da Eletrobrás, e a própria desestatização, já que desprezadas as pré-condições da Lei 14182. Cabe, agora, a rápida intervenção da CVM.
Caso o órgão regulador deixe de agir para sustar de imediato as referidas operações bursateis, restará a ação da Procuradoria, ou então dos Tribunais.
-em 20.06.2022
Preço dos Combustíveis – Limitar ICMS ? O Caminho é Outro
Dércio Garcia Munhoz
É preocupante o caminho traçado pelo Governo frente ao imbróglio dos preços dos combustíveis. Pois fazer alterações restritas a componentes de custos que se agregam ao longo da cadeia produção/consumo – nos tributos, ou em outras parcelas como transporte, distribuição ou varejo – é uma escolha equivocada, e portanto inócua. Afinal tais adicionais, sendo ad-valorem, são atrelados aos preços-base no trajeto pós-refinaria. Estes, os preços-base, é que importam.
É preciso enfatizar que, se os preços estão agora anormalmente altos, isso apenas reflete os aumentos (injustificados) ocorridos na base. Se feita a correção na origem – eliminando a ação abusiva da Petrobrás de, extraindo petróleo a US$ 5,0/barril cotar em suas planilhas de custos mais de US$ 100,0/barril – automaticamente os sobre-preços estariam removidos.
A operação de ajuste é simples. Basta a empresa reintroduzir nas planilhas os custos do petróleo praticados em 2020 – US$ 40,0/barril (que depois alterou para US$ 70,0 em 2021, e agora supera US$ 100,00) – para fazer a reversão dos preços finais para níveis próximos a metade dos atuais, já que toda a cadeia dos preços se reacomodaria. A partir daí os preços dos combustíveis seriam periodicamente atualizados com base na inflação (proxy dos custos) – e jamais pelo câmbio ou com base no preço internacional do petróleo.
Restabelecida a estrutura de custos de 2020, a empresa retornaria aos resultados financeiros de 2019 (desde que não venha a ocorrer nova e extraordinária baixa contábil, como em 2020). Com isso estaria garantida a participação do Tesouro – de R$ 40,0 bilhões – e valor próximo a esse no Lucro Liquido e na distribuição de dividendos.
. É grave que o esquema aprovado pelo Governo consagra exatamente o que tem de ser corrigido: a política de preços escorchantes da Petrobrás. Que garante aos acionistas injustificáveis ganhos milionários, fazendo destes os unicos beneficiários das descobertas do pré-sal e dos avanços tecnológicos da Petrobrás. Ganhos que, afinal deveriam reverter em favor da economia, da população e do futuro do país.
Um alerta. Os preços estratosféricos dos combustíveis provocaram um custo adicional na economia brasileira, em 2021 e em elação a 2020, estimada em R$ 250,0 bilhões, com fortes pressões inflacionárias.
A cena, que se repete agravada em 2022, pode ser classificada como dramática. Agora os dividendos, crescendo 50,0%, devem alcançar R$ 150,0 bilhões. E o aumento dos custo dos combustíveis na estrutura produtiva brasileira, em relação a 2020, deve tangenciar R$ 400,0 bilhões. O que tem o mesmo efeito, em termos de custos extras, a um aumento de 33,0% em todos os tributos federais. Com impacto inflacionário devastador. E desemprego, e fome, assustadores. Resta agir com rapidez.
-em 17.06.2022
ELETROBRÁS (I) – Golpe de Mestre.
Dercio Garcia Munhoz, Economista
Numa sucessão de manobras já consagradas nas ações do Ministério da Economia, a Eletrobrás é a bola de vez. O cardápio inclui omissão de fatos, divulgação de informações inverídicas, promessas descabidas em negociações não republicanas no âmbito do Congresso. Repetindo-se com freqüência o que se observou em eventos vários, como quando da recente reforma da previdência.
O que fica claro no episódio Eletrobrás é que tudo que tem sido feito para o sucesso da arremetida tem o objetivo único de transferir para investidores privados uma das poucas jóias em áreas estratégicas que restam nas mãos do Estado. E para assegurar o sucesso da empreitada o Ministério da Economia e seus parceiros preferidos – dentre eles Minas e Energia, ANEEL, e BNDES – escolheram um caminho infalível: transferência de energia das Usinas da Eletrobrás, pós privatização, para o mercado livre.
O modus operandi recorre à liberação dos controles atuais através de novas outorgas prorrogando o prazo das concessões de usinas, remoção de quotas (decotização) e extinção do sistema de cotas de garantia física das UHEs (limites para contratos de venda, dados pela capacidade de oferta da geradora). É uma ação precisa, de efeitos fulminantes, assemelhando-se à uma clássica operação de butim.
Transferir para o mercado livre energias até agora sob regulação tem o evidente propósito de aumentar os ganhos, e os dividendos, da Eletrobrás privatizada. O que confirma ser falso afirmar que a privatização em tela não tende a elevar o preço da energia. E o fará, atingindo exatamente os consumidores médios – predominantemente empresas menores, que para isso e através de regulamentação, estão sendo empurrados para o mercado livre. Não cabendo a ilusão de se reeditar a vitória de David contra Golias.
Impossível negar o caráter do ardil, comandado sem escrúpulos pelos ditos liberais, que envolve doação ilegal de patrimônio público e tende a agravar os desajustes econômicos e sociais do país. Restando a esperança de o Governo abortar a
operação, e ainda impedir outras ações igualmente voltadas para os interesses da Avenida Paulista.
Sobre os impactos da aventura é essencial ouvir o que disseram especialistas desde que as idéias de privatização da Eletrobrás, no Governo Themer, assumiram lugar de destaque nos objetivos de novos avanços na apropriação do patrimônio público:
“A idéia em estudo é que a mudança nesses contratos em “regime de quotas”, em que a tarifa cobre apenas custos de operação e manutenção das usinas (antigas) permita uma licitação da energia, que poderia ser revendida a preços maiores no mercado, disse à Reuters o secretário-executivo do MME, Paulo Pedrosa” (Agência Reuters – 05-05-2017, Luciano Costa, Internet, extra.globo.com).
Na mesma fonte é possível saber, como fato inquestionável, que “O Presidente da Abradee ……disse à Reuters que a energia das usinas em regime de cotas é vendida para as distribuidoras a entre 50 e 60 reais por megawatt-hora, enquanto poderia
valer mais de 200 reais no mercado de eletricidade’.
Sem dúvida perpetua-se um crime brutal. Pois todo o aumento de custos na economia, independente da origem, tem os efeitos concentrados sobre assalariados e outros grupos de menor renda. Maiores custos, mais inflação, ¾ da população não tem como reagir, através de repasses. Queda do poder de compra, recuo do consumo e do emprego, mais pobreza, mais famílias famintas. A caravana passa, indiferente . .
Dgm./em 13.06.2022
ELETROBRÁS (II) – A Tramóia Confessada.
Dercio Garcia Munhoz, Economista
Aumentar os preços da energia e assim os ganhos dos rentistas, através da privatização da Eletrobrás e em linha com os interesses do mercado financeiro, transcende uma operação de disputa de mercado. Significa mais que isso, um acinte, um ato a mais para agravar a crise econômica e social.
A ousadia revelada pela ação conjunta do Executivo e Legislativo assombra. Pelo clima que presidiu as negociações, e pela forma e conteúdo do produto gerado (Lei 14.182/2021), que poderia ser classificado como um desprezível e repugnante lixo legiferante, que deslustra a história do Congresso. E ainda mais agora, quando os objetivos das manobras comandadas pelo Ministério da Economia deixaram as sombras, confirmando-se à luz do sol o seu caráter traiçoeiro e predatório.
Se dúvidas persistissem quanto aos alvos da empreitada, bastaria uma leitura rápida do prospecto da oferta publica de ações, divulgado agora pela Eletrobrás, onde se afirma que “… a Eletrobrás possui, de certa forma, parte de sua receita ‘travada”, o que a impossibilita de absorver oportunidade com dinâmicas de preço do mercado”. Logo em seguida acrescentando, referindo-se à transferência de energia para o mercado livre, que tal renovação propiciará a comercialização de energia no mercado livre, praticando preços de mercado e, portanto, se beneficiando de dinâmicas de precificação diferentes”. É preciso mais clareza ?
O mesmo documento oficial revela que a Eletrobrás atualmente possui apenas 32,0% de sua venda de energia no mercado livre. Estimando que, com as mudanças programadas, as receitas de venda da energia previstas para o período 2023/2031 terão um aumento superior a 100,0%. Exatamente !
Nenhuma novidade no degradante episódio que envolve a Eletrobrás. Afinal quando da privatização das Usinas de Junia e Ilha Solteira, da CESP, em 2015 – com resultados por razões óbvias pouco divulgados – as tarifas saltaram de R$ 36,0/megawatt-hora para R$ 124,38 (Correio Braziliense, 26.11.2015, p. 15). Com um modesto reajuste – apenas 245,0%. No caso, evidente, para alegria do Governo chinês. Que se espraia num país que esfacela seu patrimônio e seu futuro. Por um punhado de dólares …..
A mágica arquitetada pelo Governo é renovar concessões, recebendo da Eletrobrás o valor das outorgas, permitindo substancial e não estimado aumento de tarifas, destinando parte do valor das outorgas para a concessão de subsidio que compense parcialmente o aumento de preços. Maquiavélico, sem dúvida. Pois resta perguntar: subsidio de quanto ? previsto para quanto tempo ? Onde os números ?
Incertezas outras existem quanto aos subsídios. Afinal, quando da discussão do fatídico projeto, o Ministro da Economia prometeu ao Congresso – e assim publicaram os jornais – que com as outorgas distribuiria R$ 30,0 bilhões de verbas através de parlamentares. Juras que agora se juntam às promessas de, com os mesmos recursos, e pensando na multiplicação dos pães, também subsidiar combustíveis.
-em 13.06.2022
Porque a Privatização da Eletrobrás Seria Inconstitucional
Dercio Garcia Munhoz, Economista
O governo encaminha a privatização da Eletrobrás segundo as regras da Lei 4182/2021, Art 1o, Pár. 1o, que estabelece: “A desestatização da Eletrobrás será executada na modalidade de aumento do capital social, por meio da subscrição pública de ações ordinárias com renúncia do direito de subscrição da União, e será realizada mediante a outorga de novas concessões de…”.
– Ora, a modalidade estabelecida na lei altera a participação dos acionistas na propriedade da empresa, aumentando o valor do patrimônio daqueles que subscrevem as novas ações, e reduzindo para os que não fizerem a subscrição, como seria o caso da União. Então, de fato, com o Governo não subscrevendo ações novas, o que ocorreria seria uma transferência de parte do patrimônio público para terceiros – indiscutivelmente uma doação de bens públicos.
O que não está previsto na Lei 14182/2021, nem na Lei 9491/1997.
– A doação de bens públicos é disciplinada pela Lei 8666/1993, que abrange, dentre outros, empresas públicas e sociedades de economia mista, requer avaliação prévia, e é “…permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública …” (Art. 17, I-B)
– No caso da Eletrobrás, com o lançamento de novas ações – aproximadamente 200,0 milhões – a União estaria reduzindo sua participação da Eletrobrás de 42,5% para 37,8% sobre o global das ações, perdendo um naco próximo de 5,0% da propriedade da empresa. Pelo valor patrimonial da ação, a doação seria perto de R$5,0 bilhões; se levado em conta o valor estimado do patrimônio da Eletrobrás e dezenas de suas subsidiárias, de no mínimo, R$500,0 bilhões, a ser avaliado conforme estabelece a lei, a doação camuflada, engatilhada intramuros, seria de no mínimo de R$25,0 bilhões.
– É, fundamental não desprezar o fato de que a Eletrobrás responde por mais de 40,0% da energia gerada no país, e tem responsabilidade por mais de 70,0 mil km. de linhas de transmissão, e papel fundamental para a economia, para a população em geral, e para o futuro do país. Não cabe espaço, portanto, para que o encaminhamento da questão se veja envolvido, por ação ou omissão, em um nível tão grave de irresponsabilidade dos diferentes poderes da República.
-dgm./11-05-2022