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IV. In-Previdência – Servidores Federais. Uma Reforma Que Deforma

IV. In-Previdência – Servidores Federais. Uma Reforma Que Deforma

                                                            Dercio Garcia Munhoz.  Economista Emérito pelo Corecon-DF. Foi                                                             Professor Titular de Economia da UNB.  Ex-Presidente do Conselho Federal de Economia e do Conselho Nacional da Previdência Social

         Um tema como a previdência social mereceria um debate com base em informações transparentes, imparcialidade nas análises e conclusões fundamentadas. Infelizmente muito pouco daquilo que se poderia considerar como desejável está presente nas propostas que o Governo apresentou como base para apreciação legislativa. E ainda o fez sob uma saraivada de sufocantes mensagens publicitárias, como se fora o lançamento de algum novo produto no mundo comercial.

         São muitos os reparos que a postura do Governo – tanto o atual como o anterior – requerem.  Todos fundamentalmente atrelados ao desejo, implícito no discurso oficial e impossível de ser dissimulado, de que a população não venha a ter uma percepção clara do que realmente ocorre com a previdência social.  E nesse aspecto a questão previdenciária relacionada aos servidores federais merece um capitulo próprio.  Tal o nível de desinformação que a maquina oficial propaga sem pudor.

         Três são os aspectos principais que deveriam ser considerados na análise dos problemas previdenciários dos servidores civis da União, e na formulação de propostas visando eventuais reformulações:

a)   não se pode falar na existência de déficit na previdência do setor publico federal – e nesse caso se trata do núcleo  de servidores ingressados até 2003, onde estão os aposentados atuais – e isso simplesmente porque o Governo nunca fez um sistema de previdência que abarcasse esse grupo;  tendo o Tesouro – no caso a entidade patronal – assumido diretamente, por séculos, o pagamento dos encargos de ativos e inativos.  A omissão do Governo se lastreava no fato de que a criação de um fundo de pensão (que assumisse os encargos previdenciários dos servidores complementarmente ao INSS – no estilo PREVI, PETROS, etc.), traria despesas adicionais da ordem de 22,0%, no modelo usual, sobre a folha de salários do funcionalismo, que seria a contribuição do empregador.  Foi mais fácil fingir que o problema não existia;  como, aliás, generalizadamente também se verificou nas administrações estaduais e municipais;

b)  criou-se, com tal descaso, um passivo previdenciário para a União, que logicamente foi-se avolumando à medida que o tempo avançava. E só passou a incomodar quando, com a irresponsabilidade da dupla Ministério da Fazenda/Banco Central, taxas de juros absurdamente elevadas geraram um gasto financeiro de R$ 4,7 trilhões no acumulado de  2002 a 2018 (em valores de dezembro/2018), que são os dados conhecidos; e, consequentemente, uma divida publica impagável.  Daí as pressões do chamado mercado – que das sombras comanda o descaminho da política econômica –  que, fingindo desconhecer que as políticas monetária e de reservas internacionais quebraram o Tesouro,  não aceita que o Governo continue pagando juros com o fruto da emissão de novos títulos da divida publica;  daí pressionando para que se descubra recursos fiscais – venham de onde vier – para cobrir as despesas financeiras, ao menos parte, com dinheiro vivo.  Situação que, além da tentativa em andamento de destruir a previdência publica, faz com que se pretenda, na área do funcionalismo federal, jogar sobre os servidores o ônus do passivo previdenciário do Governo, com uma contribuição que financie os encargos com aposentadorias e pensões da União.  Objetivo não factível, que, na ânsia de manipular a desinformação, deu margem a tonterias como pretender fazer crer que um magistrado da Justiça, ou ocupantes de cargos na cúpula da administração, deveriam ter vencimentos nos níveis de ocupações que requeiram pouca qualificação. 

 c)  é impossível, por outro lado, discutir com seriedade a questão das despesas com os inativos da União, se não for considerado que dos aproximadamente 640,0 mil funcionários civis ativos que existiam ao final de 2003 – que são aqueles desprovidos de sistema previdenciário – praticamente a metade já se aposentou; o que limita, no tempo, a existência de novos aposentados com encargos sob responsabilidade do Tesouro.  Além do que, considerando que a base contributiva para fazer face às despesas de aposentadoria/pensões do grupo ingressado até 2003 seria em torno de R$ 140,0 bilhões  (R$ 62,4 bilhões referentes  à metade da folha de salários atual de  civis ativos –  os ingressados até 2003 – mais  R$ 78.0 bilhões das folhas de  aposentados e pensionistas), como obter sobre tal base os R$ 78,0 bilhões necessários para pagar inativos e pensionistas, removendo aquilo que impropriamente o Governo classifica como déficit previdenciário ?  Afinal a conta só fecharia com uma contribuição acima de 55,0% sobre os citados proventos.  Ou o Governo, embolando os vários grupos de servidores sob condições diferenciadas no que toca à previdência, como o faz, pretende utilizar, para aposentadorias e pensões dos ingressados até 2003, contribuições de funcionários pós-2003 ?  Uma questão tão misteriosa como descobrir de que forma o Governo pretende confiscar os R$ 4,5 trilhões dos trabalhadores, em vinte anos, como propõe na reforma da previdência, e que a Câmara parece não ter lido na integra.              

-dgm.;/29.07.2019

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foto autor do post

Dércio Garcia Munhoz

Economista